O termo “fósseis, ou formas de transição” tem vindo a cair em desuso, pois refere-se a espécies extintas que representam um estádio intermédio entre dois grupos de organismos, e incorporam simultaneamente características ancestrais e derivadas dos mesmos. O termo “fóssil de transição” é desadequado, tendo em conta a metodologia de classificação filogenética e o conhecimento sobre como a evolução atua.
Um fóssil que não é de transição – Archaeopteryx
Num terrível dia no final do Cretácico, um asteroide do tamanho de uma montanha embateu contra aquilo que é atualmente a costa do Iucatão, cravando-se na terra e desencadeando uma série de acontecimentos catastróficos. O final do Cretácico foi uma época de alteração global do clima do planeta com o nível dos mares a baixar, mares epicontinentais que secaram, terras separadas pela água que passaram a estar unidas e espécies novas que podiam migrar para novos territórios. Aquele embate na costa do atual México vaporizou rocha e gases nocivos espalharam-se pela atmosfera. Florestas foram obliteradas por todo o mundo e as temperaturas oscilaram de forma dramática. O impacto e as suas consequências num planeta em crise ambiental puseram fim ao reino dos dinossáurios.
Na verdade essa erradicação não foi completa
A “Vida” encontrou uma maneira de subsistir e alguns “dinossáurios” sobreviveram à extinção. As aves modernas são o último ramo remanescente da árvore genealógica destruída dos dinossáurios, Imagem 1.
Imagem 1 – Uma das árvores genealógicas proposta para “família das aves”. A origem das aves dá-se a partir de dinossáurios terópodes (grupo ao qual pertence o Tyrannosaurus rex). Não se pode afirmar que ocorre a transição dos dinossáurios para as aves, nem sequer dos répteis para as aves, pois do ponto de vista filogenético, as aves são dinossáurios e répteis. Procurar a transição entre répteis e as aves é como procurar a transição entre os mamíferos e os primatas: não existe! Isto sob o ponto de vista taxonómico lineano, é claro. O que acontece é que as aves são répteis.
A paisagem infernal deixada pelo asteroide terá dado alguma vantagem aos antepassados das aves contemporâneas dos seus “primos” do Cretácico.
A mais antiga raiz conhecida da árvore genealógica das aves é o Archaeopteryx, Foto 1, com 150 milhões de anos. Embora atualmente nenhuma ave tenha dentes, o Archaeopteryx possuía mandibulas crivadas de dentes afiados. Tinha os membros anteriores equipados com garras e cauda longa e ossuda. Estas características que se foram perdendo nas aves, revelam laços próximos com os seus primos reptilianos. No entanto, no Archaeopteryx encontram-se também características de aves contemporâneas. Os seus fósseis mostram asas proeminentes cobertas por penas aerodinâmicas. Após a sua descoberta em 1860, a espécie foi considerada como uma etapa de transição entre os dinossáurios e as aves, mas poucos fósseis foram descobertos de forma a preencher as lacunas que existiam da evolução desta “transição”.
Foto 1 – Em 1861, operários numa pedreira na Alemanha desenterraram fósseis de uma ave com a dimensão de um corvo, batizada de Archaeopteryx , que viveu há cerca de 150 milhões de anos. Possuía penas e outras características das aves hoje existentes, mas também vestígios de um passado reptiliano, como dentes na boca, garras nas asas e uma cauda longa e ossuda. Museu de História Natural – Estugarda, Alemanha.
E se os dinossáurios-avícolas ainda existissem em que família seriam colocadas as “aves”?
O método de classificação lineana, sugerido por Carolus Linnaeus foi desenvolvido sem noções de evolução, e talvez por isso está atualmente a cair em desuso para dar lugar a clasificações filogenéticas que procuram refletir a evolução de um grupo de organismos.
Em 1996 foi revelado o primeiro fóssil de um dinossáurio com penas, sem qualquer parentesco com as aves. Dezenas de espécies de dinossáurios com penas foram extraídas das formações rochosas chinesas do Cretácico. Dinossáurios não-avícolas e de aves primitivas, Foto 2, acompanhadas por penas, escamas e pele emergiram destas formações na China. As aves são excecionalmente diversificadas. Há mais de 10.000 espécies conhecidas, todas elas descendentes de um grupo de dinossáurios. Os mais recentes indícios genéticos e achados fósseis sugerem o aparecimento de, pelo menos, três linhagens de aves, que emergiram durante o Cretácico e sobreviveram ao impacto do asteroide que matou três quartos da vida na Terra.
Foto 2 – Rhamphorhynchus muensteri, Pterossauro do Mesozoico alemão. Museu de História Natural de Berlim, Alemanha. Os Pterossauros constituem uma ordem extinta da Classe Reptilia que corresponde aos répteis voadores da Era Mesozoica. Embora fossem seus contemporâneos estes animais não eram dinossáurios. No percurso evolutivo, os organismos vão acumulado características morfológicas, mantendo ou perdendo os caracteres tido inicialmente. Os grupos taxonómicos, ou clados, são diagnosticados através de características morfológicas novas adquiridas e partilhadas entre todos os membros deste clado.
No rescaldo da catástrofe, a diversidade dos sobreviventes aumentou explosivamente e a sua árvore ramificou-se velozmente.O asteroide que aniquilou os dinossáurios há cerca de 66 milhões de anos teria deixado alguns sobreviventes. Entre elas estariam certamente os antepassados das aves, que aproveitaram o nicho ecológico entretanto aberto para prosperar.
Fonte:
National Geographic – Maio 2018
Fósseis de transição, elos perdidos, fósseis vivos e espécies estáveis – Octávio Mateus
Não é de fato uma surpresa, apenas acostumar com o fato, e posteriormente reorganizar o sistema de classificação, devemos lembras que nós mamíferos também somos repteis, e que devido o longo período que nossos ancestrais se diferenciaram dos outros repteis deixamos de considerar nosso parentesco, mas ainda assim temos exemplos vivos da nossa ligação, os monotremados (ornitorrinco e equidnas), que ainda possuem cloaca, e botam ovos e fazem a regulação da temperatura corporal externamente (ao menos parcial).